Aftersun

Aftersun

1 de maio de 2023 0 Por Filipe R. Bichoff

Todos temos alguma memória que gostaríamos de reviver, ou permanecer nela, geralmente de momentos relacionados a infância pois se trata de um trecho da vida em que tudo parece mágico e único. Mesmo que em meio à tais memórias tenha um momento triste, a mesma mantém vivo algo que levamos para a vida, e que por fim pode nos trazer aprendizados quando olhamos sob a perspectiva de um adulto.

Em Aftersun, a diretora Charlotte Wells não só mescla momentos de sua vida com a ficção como leva o público a fazer o mesmo, e talvez seja isso que faça do longa uma subjetiva tão única e sensível, por tornar a experiencia de cada espectador algo particular, se conectando não só com a trama em si, mas com alguma memoria perdida que em algum momento o longa traz a tona. 

A opção em alternar para momentos em que o longa passa a ser brevemente um found footage, faz do mesmo algo particular, semelhante à memórias que com o passar do tempo se fragmentam mas continuam vivas, vindo à tona através de algum gatilho, no caso de Sophie (Frankie Corio), seu aniversário. Um detalhe que também aproxima o publico dos personagens, pois a impressão que fica é que estamos diante de algo particular.  

O carisma dos personagens é parte crucial na parte funcional do longa, pois é responsável pela conexão entre personagens e espectador, logo, com a relação entre os mesmos. Frankie Corio é de um carisma acima da média, seu talento se faz necessário pois é ela a responsável por basicamente conduzir a trama, especialmente nos momentos em que o personagem de Mescal se volta para dentro de si, e seu personagem traz momentos contemplativos que aludem a seu estado mental incompreendido pelo filha, até então uma criança. 

O longa se trata de uma proposta intimista, sendo não só um mergulho da diretora em suas memórias mas levando o espectador a fazer o mesmo, e isso o longa faz com maestria, seja através dos diálogos entre pai e filha sobre a vida, ou dos registros de momentos felizes e tristes, que dão forma a narrativa do longa, incluindo a problemática quando necessário, somados a inúmeros momentos cômicos, acessando alguma memoria esquecida do espectador. 

A narrativa parte de uma premissa despretensiosa, mas que aos poucos vai ganhando peso, elevando mais e mais a carga dramática de cada sequência, pois a cada momento o público se ve mais próximo daqueles personagens e de uma auto reflexão, em que uma sequência simples pode ter um peso enorme ao ponto de levar o espectador às lágrimas através de uma canção alegre. 

O trabalho de Paul é sutil e certeiro, transmitido a felicidade do personagem ao estar com a filha e ao mesmo tempo com pequenos gestos revela que algo o incomoda, e que a viagem que para filha parece perfeita não tem o mesmo efeito sob ele, detalhe enfatizado pelos momentos em que o mesmo está só, Calum perde o brilho e a fotografia mais escura enfatiza isso, revelando talvez um estado de depressão do personagem, podendo ter ligação com sua infância difícil, assunto do qual o mesmo tem uma breve recusa a falar, mas que a história do telefone vermelho ilustra com eficiência.  

São detalhes invisíveis aos olhos de uma criança, que só consegue enxergar a diversão e não entende o porquê o pai se retrai em determinados momentos, e a narrativa que se fragmenta entre passado e presente revela uma Sophie que enfim entendeu o sofrimento do pai. Isso faz da sequência final uma das mais belas, e tocantes do longa, em canção e cena, pois remete a compreensão da personagem, sabendo a importância daquele simples momento.

Crítica por: Filipe R. Bichoff

Título: Aftersun

Avaliação: ⭐️⭐️⭐️⭐️⭐️ / 10

Direção: Charlotte Wells

Elenco: Paul Mescal, Frankie Corio, Celia Rowlson-Hall, Sally Messham

Duração: 1h 42m

Roteiro: Charlotte Wells

Fotografia: Gregory Oke

Trilha sonora: Oliver Coates

Ano: 2022