Tic-Tac: A Maternidade do Mal
A sociedade é repleta de imposições, das quais se ausenta de qualquer responsabilidade, ou algum tipo de auxílio, com exceção de impor o certo, errado e deveres. A vontade do indivíduo? Quem se importa? O que realmente importa é sua imagem perante a uma sociedade acolhedora e amiga, que jamais irá julgar a escolha de alguém (risos), especialmente para com um assunto tão delicado e particular como é a maternidade.
O longa nos apresenta Ella (Dianna Agron), uma mulher jovem, dependendo do ponto de vista, mas sim jovem, bem sucedida e com um relacionamento saudável, mas tem um porém, a mesma não sente vontade de ter filhos, algo que automaticamente a coloca em evidência, seja na roda de amigas ou para o próprio pai, quase como uma herege, por recusar algo que segundo terceiros é mágico e repleto de momentos incríveis.
Então o longa traz um estudo de personagem que passeia pelo terror psicológico, de maneira eficiente, a diretora usa de coisas simples para articular sobre o assunto e levar o público a entender o terror que uma mulher vive pelo simples fato de negar a maternidade, ou simplesmente não sentir vontade. É interessante notar que aqui não temos os dois lados, a diretora não tenta colocar o público em cheque a ponto de vilanizar a protagonista, o que vemos em tela é a visão de Ella a respeito da maternidade, e sobre o que ela abriria mão em prol disso.
O clima é constantemente tenso, cada pergunta tendenciosa causa desconforto, e é isso que o longa busca, causar no espectador o desconforto sentido pela protagonista, seja onde ela for a maternidade parece segui-la, assombra-la a todo momento, seja através de imagens ou questionamentos.
A trilha sonora é pontuada por um grave constante, na intensão de aludir àquela sensação de sufocamento, afim de criar um ambiente opressor, especificamente nas consultas em que a protagonista se vê vulnerável. E tudo que vemos aqui ganha mais sentido e profundidade, pois parte do olhar preciso de uma mulher, a diretora Alexis Jacknow expõe com propriedade tudo que está em tela.
Um detalhe que incomoda, e que se faz recorrente durante o longa é a tendência aos clichês do gênero, talvez algo que se dê pela pouca experiência da diretora, e mesmo que faça sentido narrativo em alguns momentos, me refiro as alucinações, pois a personagem está sob efeito de medicamentos, não deixa de ser um ponto negativo, pois se repete em vários momentos que somados aos jump scares faz o longa perder e muito em qualidade, o que não aconteceria se o mesmo se limitasse ao terror psicológico.
O elenco reduzido é um acerto, se limitando basicamente a três personagens, pois ainda assim um deles incomoda, me refiro ao marido (Jay Ali), sua falta de expressão é notável e destoa do longa como um todo, sendo ressaltado quando precisa contracenar com Agron.
O plot final é chocante, porém a maneira como ele é construído no decorrer do longa é trapaceira, mesmo que seja possível notar algo a mais na sequência final do relógio, ainda assim ela é falha, pois engana o público que tem a impressão de estar assistindo algo que não existe, uma ilusão, especialmente quando essa “revelação” é colocada apenas no final.
O tratamento com um todo é a parte melhor desenvolvida no longa, em que a consulta em si nada mais é que uma forma de aludir à tortura, com instrumentos dignos de algo assim, uma maneira de obrigar a protagonista a aceitação, dizer sim quando sua vontade é dizer não, a levando a um estado psicológico em que suas ações já não condizem com suas vontades e acaba cedendo a pressões externas, seja do marido, família ou amigas.
Não fosse a direção se deixar levar pelos clichês, o resultado final seria melhor, se limitando a algo mais íntimo e menos visual, como vinha sendo feito até a metade da duração, por sorte o longa não se estende demais conseguindo um resultado equilibrado entre erros e acertos, com um saldo final positivo.
Crítica por: Filipe R. Bichoff
Título: Tic-Tac: A Maternidade do Mal
Avaliação: ⭐️⭐️⭐️ / 6,0
Direção: Alexis Jacknow
Elenco: Dianna Agron, Jay Ali, Melora Hardin, Grace Porter, Saul Rubinek
Duração: 1h 31m
Roteiro: Alexis Jacknow
Fotografia: Martim Vian
Trilha sonora: Stephen Lukach
Ano: 2023